
Ensaios sobre acontecimentos sociopolíticos, culturais e institucionais do Brasil e do mundo
Homenagens a Marcio de Freitas Giovannetti
Por Any Trajber Waisbich, Ana Maria Loffredo e Silvia Martinelli Deroualle – SBPSP
Amizade
Any Trajber Waisbich – SBPSP
Ao meu querido amigo, Márcio. Esta é uma mensagem de despedida.
Acabo de saber que você faleceu e um vazio percorre minha alma e me sufoca.
Lembro-me do seminário clínico, da tua paixão em acompanhar os casos e de como nunca nos impunha condutas. Foi ali que escolhi o meu supervisor para o segundo relatório. Minha confiança cresceu, e você me escutou com atenção, ajudando-me a atravessar esse processo que, pelas tuas mãos, foi delicado e, ao mesmo tempo, profundamente contundente.
Passamos semanas debruçados sobre aquele paciente — e sobre muitos outros, desde então. Compartilhei pensamentos e teorias para cada um deles. Você, por sua vez, me contava dos teus analisandos. Havia respeito, parceria e um certo conluio bom, silencioso, daquele que só se estabelece nos encontros verdadeiros.
Márcio, você se divertiu e ajudou a cada um de nós até o final. Dizia que eram os pacientes que te ajudavam a seguir em frente e a manter a esperança. O tempo passava discretamente, e você se esquecia das tuas próprias dores, dedicando-se ao que mais gostava de fazer. E, claro, não nos esqueçamos do tênis — que você jogou até o final.
Falava com admiração da Salete, companheira de tantos anos, cercados de bons amigos. Tinha orgulho da Júlia e do Bruno, confiava profundamente neles, e era absolutamente louco por Luca e Laura. Ficou radiante quando Luca entrou na GV, e contava com ternura como Laura, aos 15 anos, é linda e esperta.
Você adorava a Itália: aprendeu italiano, viajou com teus irmãos para Siena e conseguiu a cidadania da “bota”. Contou que não aguentou ficar naquele país e fugiu antes do tempo — ninguém percebeu.
Márcio tinha uma mãe de 99 anos, ainda viva. Ontem, no jardim, puderam se ver por alguns instantes. Choraram.
Você foi corajoso: descobriu o câncer e decidiu como gostaria de viver o resto dos seus dias. Dignidade e força são as palavras — e, acima de tudo, o apoio da tua família.
Não posso me esquecer dos almoços e jantares na tua casa, das comidas maravilhosas que preparava para nós.
Teus pacientes, supervisionandos e alunos não te esquecerão e transformarão teus ensinamentos em percursos próprios.
Você nos deixa depoimentos, um livro (que resenhei), artigos publicados. Foi presidente da SBPSP nos momentos mais difíceis da instituição, diretor em várias gestões. Participou de inúmeros comitês da IPA e fez a diferença. Tem amigos espalhados por todos os continentes que sentirão profundamente tua falta.
Adeus, pessoa querida. Analista sensível, mentor e amigo sempre presente. Sentirei tua falta a cada conquista, a cada risada que partilhamos; das comidas deliciosas que preparava; do dançarino que era; da tua companhia. Saudades. Enorme beijo, Any.
Gratidão
Ana Maria Loffredo – SBPSP
Compartilhar com o Márcio o privilégio do convívio por tantos anos e a atividade de supervisão foi um exercício de liberdade: o vislumbre de atraentes horizontes na conquista de meu próprio estilo e, para além do afeto que nos unia, o aprimoramento da beleza e da grande aventura subjacente a nossa atividade como psicanalistas, cuja pulsação poética nos anima e nos alimenta.
Com seu jeito direto e caloroso, sem fazer rodeios, assertivo e estimulante, nos convidava a prezar e a cultivar o que nos é mais precioso, significativo e singular – com garra, bondade e flexibilidade, para responder de forma genuína ao que nos toca e nos convoca mais profundamente.
Nesta semana, apresentei meu Primeiro Relatório de Supervisão, depois de uma interrupção de muitos anos e quando o procurei, tempos atrás, um tanto na dúvida sobre esse momento de decisão e de eventual retorno, sua acolhida confiante e amorosa foi atravessada, como sempre, por aquela sabedoria mansa e cheia de energia, que nos olhava de modo agudo e tranquilo, enxergava longe e nos apaziguava. Foi muito emocionante encontrá-lo firme em seu consultório, contando sobre a decisão corajosa em relação a sua doença, com clareza e sensibilidade. Saí desse encontro com o olhar brilhando e um caminho novo que se abria à minha frente.
Minha gratidão vem recheada de saudade e de admiração, e da certeza que somos um grupo vibrante e especial no qual ele deixou suas marcas generosas de modo definitivo. Ana Maria Loffredo
Liberdade
Silvia Martinelli Deroualle – SBPSP
Nesses longos anos de convivência na supervisão ocorreram importantes trocas que me proporcionaram muita riqueza para a vida e como psicanalista.
O entrelaçamento entre vida e profissão me deu liberdade para trabalhar do meu jeito, ser o que sou sem enquadramentos que engessam.
Querido Marcio, muito obrigada por ter me acompanhado nesses anos todos com firmeza, dedicação e carinho!
Palavras-chave: despedida, analista, supervisor, professor e amigo.
Imagem: Marcio de Freitas Giovannetti
Categoria: Homenagem; Instituição Psicanalítica
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