
Ensaios sobre acontecimentos sociopolíticos, culturais e institucionais do Brasil e do mundo
Flotilha Sumud Global
Liana Albernaz de Melo Bastos – SBPRJ
Para meu sobrinho Miguel Bastos Viveiros de Castro
Miguel é nome de arcanjo. Dizem que é arcanjo venerado nas tradições judaicas, cristãs e islâmicas como o líder dos exércitos celestiais e defensor da fé contra o mal. Não sou muito versada nas esferas celestes, mas das humanas sei um pouco.
O Miguel de que falo nasceu no exílio de seus pais, eles próprios com suas vidas atravessadas por prisões e horrores da ditadura brasileira. Miguel não era anjo e, ao nascer, já precisou travar grande luta: uma fenda labial que o impedia de mamar. Era para ser menino franzino e tímido. Graças à criatividade brasileira, inventou-se modo de mamar. Passou por muitas cirurgias e tratamentos. Cresceu grande e forte e transformou suas experiências traumáticas em caráter de luta pela vida, sua e dos demais. Um pouco Ogum da tradição afro-brasileira.
É este o Miguel que estava no veleiro Catalina da Flotilha Sumud Global. Sumud, aprendi há pouco, significa firmeza ou perseverança inabalável. Nada melhor para descrever o Miguel.
Nesta noite, cerca de 500 ativistas de quarenta e quatro países, em cinquenta e uma embarcações da Flotilha, estavam em águas internacionais aproximando-se de Gaza para levar ajuda humanitária aos palestinos: água, comida e medicamentos. Queriam chegar a Gaza, mas queriam, sobretudo, chegar às pessoas, mostrando que ações não violentas podem ser feitas por todos nós diante de qualquer horror, no caso, o genocídio palestino. Após ataques israelenses com drones que jogavam substâncias tóxicas e canhões com jatos d’água, foram interceptados em águas internacionais por navios israelenses. O protocolo dos ativistas era de não resistência e do envio de mensagens previamente gravadas quando da abordagem israelense. Miguel não enviou mensagem.
Havia na Flotilha quinze brasileiros. O nome de Miguel não constava da lista de sequestrados e levados para a prisão israelense. Não sabemos, ainda, de modo claro, de seu paradeiro. Esperamos que o Itamaraty possa, amanhã, encontrar os nossos e nos tirar desta angústia. Precisamos garantir a vida e a integridade de todos os ativistas.
Hoje é o feriado mais importante do judaísmo: o Yom Kippur, Dia do Perdão, demonstração de arrependimento e expiação. Que os judeus possam fazer jus à tradição judaica que vem sendo massacrada pelo governo fascista de Netanyahu, apoiado pelo fascismo americano.
Sem uma Palestina livre, soberana e autônoma, e a retomada de um governo democrático em Israel, não haverá paz e dignidade.
Palavras-chave: Flotilha, ajuda humanitária, ação não violenta, solidariedade internacional, Palestina.
Imagem: Foto: Global Sumud Flotilla/Divulgação. Do site Esquerda em Movimento.
Categoria: Política e Sociedade
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