Ensaios sobre acontecimentos sociopolíticos, culturais e institucionais do Brasil e do mundo
Mirante, o podcast do OP – Prêmio IPA na Comunidade – Cultura 2024/2025
Ana Carolina Alcici (SPRJ), Ana Valeska Maia (SPFor), Beth Mori (SPBsb), Cris Takata (SBPSP), Gabriela Seben (SBPdePA), Giuliana Chiapin (SBPdePA), Lina Schlachter Castro (SPFor)
Pensar o sujeito em seu tempo: eis um dos desafios da psicanálise. Se nossa inscrição humana se dá no fluxo de uma temporalidade que a todo momento nos molda e interpela, é na abertura ao diálogo com o movediço da cultura e com as transformações sociais de nossa época que nos fazemos presentes como partícipes do movimento psicanalítico. É na trama da cultura, no inquietante da vida e da morte, na complexidade, muitas vezes surpreendente, que tece o hoje, que procuramos mirar além.
Por essa via, iniciativas como o Mirante — projeto da Febrapsi integrado ao Observatório Psicanalítico — têm relevância como um lugar de interlocução entre a psicanálise e outros campos do saber. Um podcast que promove conversas entre psicanalistas e profissionais de diferentes áreas da cultura, buscando pensar questões atuais sob a lente da psicanálise, é também um caminho de fertilização de novos rumos.
Entre seus principais objetivos estão: difundir o pensamento psicanalítico, fomentar a interdisciplinaridade, torná-lo acessível a públicos diversos, ampliar a visibilidade da Febrapsi e, principalmente, valorizar o diálogo como instrumento de transformação social. Conversar, trocar, criar pontes de contato e sentido.
Mirante, como um podcast, compartilha e coloca em circulação ideias que, historicamente, ficaram restritas ao espaço clínico ou acadêmico — fora, portanto, da vida pública. Assim, é um olhar que mira adiante e pode ser farol em tempos plúmbeos, repletos de incertezas.
Acreditamos que o caráter interdisciplinar fortalece o Mirante. Ao aproximar-se de outros campos do saber, a psicanálise não apenas se abre ao diálogo, mas também se transforma. O encontro com outras linguagens e perspectivas permite renovar perguntas, revisitar conceitos, expandir horizontes e promover a diversidade cultural e intelectual. Nesse sentido, o Mirante se constitui como um espaço de criação, onde a escuta psicanalítica se articula à escuta social e cultural. O podcast fomenta a ideia de que pensar o sujeito contemporâneo exige múltiplos pontos de vista.
A partir disso, o Mirante busca o engajamento de psicanalistas na transformação social, posicionando uma psicanálise engajada como força ativa de mudança — ao abordar temas que perpassam a saúde mental, os múltiplos aspectos da cultura, democracia, racismo, as questões sociais e o sexual na pólis, explorados em nossas temporadas desde o nascedouro do Mirante em 2022.
Os impactos dessa proposta podem ser observados de diferentes ângulos. Há, certamente, o alcance objetivo, mensurável em números de ouvintes, downloads e abrangência geográfica. Mas há também outro tipo de impacto, mais subjetivo: a ampliação da compreensão de conceitos psicanalíticos e sua presença no cotidiano; o estímulo à reflexão da comunidade sobre suas próprias vivências e questões sociais; a redução do estigma relacionado ao sofrimento subjetivo e coletivo, ao tratar de temas como saúde mental e subjetividade; a desmistificação da psicanálise; a diminuição de preconceitos associados à busca por apoio psicológico; e a inspiração para mudanças pessoais e coletivas.
Ao criar um espaço de fala e escuta, o Mirante oferece não apenas informação, mas também acolhimento e provocação — convidando cada ouvinte a se reconhecer e a se deslocar.
Ao mesmo tempo, o Mirante se afirma como uma intervenção na própria instituição psicanalítica. Não se trata apenas de levar a psicanálise ao espaço público, mas de deslocar as fronteiras do que se entende por instituição analítica — tensionando seus modos de escuta, produção de saber e relação com o mundo. Como produção coletiva derivada do Observatório Psicanalítico, o podcast atua de forma implicada: seus participantes se reconhecem afetados pelos acontecimentos do tempo presente e respondem a partir desse afeto, tensionando o ideal de neutralidade e promovendo uma ética da escuta comprometida.
Tal postura rompe com a lógica de verticalidade e fechamento que, por vezes, marca as sociedades psicanalíticas, instaurando um espaço mais horizontal, plural e processual. Nesse sentido, o Mirante é também uma experiência de agenciamento institucional — uma forma de reinvenção da psicanálise em sua tessitura com a cultura, a política e o social, na qual a palavra analítica é nutrida pela vida da pólis e pela alteridade do tempo presente estabelecendo uma coletividade de pensadores em rede.
Assim, o Mirante vai além da escuta como podcast. Ele se insere em um movimento mais amplo, alinhado à proposta da IPA de ampliar a presença da psicanálise no mundo contemporâneo. Ao aproximar leigos e profissionais de outras áreas, valorizar a diversidade cultural e promover redes de colaboração internacionais, o projeto reafirma a psicanálise como uma prática viva, aberta e comprometida com a transformação social.
Em reconhecimento a essa proposta inovadora, o Mirante foi premiado na categoria “Cultura” no In the Community and the World Awards, concedido pela Associação Psicanalítica Internacional (IPA) durante o 54º Congresso da IPA, em Lisboa (2025).
Este reconhecimento é coletivo: estende-se a todas as colegas que integraram a equipe da Curadoria desde a criação do podcast, em março de 2022, cuja dedicação e escuta cuidadosa ajudaram a construir esse espaço. Também é extensivo aos convidados e convidadas que construíram conosco os episódios.
Convidamos à escuta do Mirante. Os programas estão disponíveis nas principais plataformas de podcast.
Palavras-chave: podcasts, psicanálise, vida pública, observatório psicanalítico, curadoria
Imagem: Wania Cidade (SBPRJ) recebe o prêmio do Mirante no 54o. Congresso IPA
Categoria: Instituições psicanalíticas
Nota da Curadoria: O Observatório Psicanalítico é um espaço institucional da Federação Brasileira de Psicanálise, dedicado à escuta da pluralidade e à livre expressão do pensamento de psicanalistas. Ao submeter textos, os autores declaram a originalidade de sua produção, o respeito à legislação vigente e o compromisso com a ética e a civilidade no debate público e científico. Assim, os ensaios são de responsabilidade exclusiva de seus autores, o que não implica endosso ou concordância por parte do OP e da Febrapsi.
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