Observatório Psicanalítico OP 567/2025

Olá pessoal boa tarde,

Publicamos hoje a terceira publicação de ensaios de colegas candidatos a nos representar no Board da IPA. O ensaio é de Maria Pia Costa, nossa colega da Sociedade Psicanalítica do Peru (SPP), OP 567/2025, sobre “Tempos em Trânsito”

Boa leitura a todos e todas.

Ensaios sobre acontecimentos sociopolíticos, culturais e institucionais do Brasil e do Mundo

Tempos de Trânsito

Maria Pia Costa – SPP (Sociedade Psicanalítica do Peru)

Gostaria de começar fazendo uma espécie de apelo pelas instituições psicanalíticas. São poucas as profissões que se apoiam tanto nas suas instituições como a nossa, e isso tem a ver com as particularidades do nosso trabalho. Szpilka (citado por Fainstein, 2013) afirma que “a natureza peculiar do inconsciente precisa ser protegida pelas instituições que a abrigam, e, inversamente, paradoxalmente, as estruturas institucionais precisam, para sobreviver: domesticar, apaziguar e abrandar o objeto cuja transmissão sustentam”.

Gostaria de retomar a formulação de Marc Auge, também citada por Fainstein (2013), sobre as instituições psicanalíticas como um “lugar”: um lugar de identidade, relacional e histórico. Um lugar que permite desenvolver nossa paixão pela psicanálise,  nos quais se entrelaçam múltiplas relações transferenciais. – mas também simplesmente amistosas, um lugar onde floresce uma história que, para não acabar atávica, deve sustentar o jogo entre tradição e renovação; e, fundamentalmente, um local que permite a geração de conteúdos próprios através da assimilação de um futuro partilhado ao longo do seu crescimento.

Sabemos que nem sempre funciona assim. Sabemos dos problemas causados pela difícil gestão do poder, pelas transferências e contratransferências não resolvidas entre analistas e analistas em formação, assim como as rivalidades entre colegas, num exercício que expõe o narcisismo à vulnerabilidade de um trabalho que envolve cada analista com seus próprios movimentos internos, tornando-se uma ameaça à convivência e à liberdade de pensamento.

A instituição psicoanalítica deve servir de proteção contra essas ameaças, tentando restringir os efeitos contraproducentes que derivam não só dos riscos – que são típicos de cada instituição – mas também daqueles que nos são particulares pela natureza da disciplina que nos une. A instituição psicanalítica tem o desafio de estar atenta à tensão que existe entre a tradição e a renovação; entre o endogâmico e a abertura; entre o estático e o movimento. A instituição psicanalítica deve processar a tensão dessas forças conflitantes, para promover um equilíbrio que permita a evolução e o dinamismo e, ao mesmo tempo, garanta sua permanência.

Mariano Horenstein (2024), em seu maravilhoso artigo A psicanálise do novo mundo, nos diz que mais que retomar à teoria dos fundadores, a chave é identificar-se com a sua perplexidade inicial. Descentrar-nos do conhecimento como imutável e sólido é essencial para aggiornar as instituições psicanalíticas em resposta às mudanças dos tempos atuais. Tempos que, assinala Mariano, já não são sólidos, com limites precisos, nem líquidos à maneira de Bauman, nem mesmo gasosos, que se evaporam, mas plasmáticos. O plasmático refere-se ao quarto estado da matéria, o mais comum no universo, pois é o estado das estrelas. 

Também é o das telas que tanto nos cercam. Não tem forma e é animado por cargas eletromagnéticas. Deixemos que ele mesmo traga esta ideia para nossa prática: “Nas estrelas, tudo é plasma, exceto a matéria escura. Essa matéria escura poderia ocupar o lugar do real diante do qual giramos, a morte, o limite, um divisor de águas com o simbólico onde terminam as palavras, o lugar da angústia. Mais cedo ou mais tarde uma análise chega a esse limite”.

Com energia esperançosa, ele insiste que a psicanálise continua a ser a melhor teoria conhecida sobre a mente, e o lugar do analista teria que ser aquele dos interstícios, do movimento, do que desloca, do resto, do que é excluído, da fronteira. Em suma, propõe-nos englobar o trans como um tema epistêmico. Voltando à abordagem das instituições como um “lugar”, esse lugar longe de ser uma rocha, acolhe o trânsito, a transição, a transposição e a transformação, sem perder o conceito de lugar. 

Essas reflexões atravessam os desafios atuais e as decisões institucionais. Assumindo esse desafio, o Conselho Profissional da FEPAL foi incumbido de explorar a possibilidade, aberta a partir da pandemia e da tecnologia mediática, de aceder a seminários, supervisões e análises didáticas fora da instituição de origem. Questão que começa a aparecer no panorama dos institutos.

O assunto é delicado e levará tempo para ser decidido. O benefício que isso significaria para as pequenas sociedades é inegável, pois possuem pouquíssimos analistas com função didática, que cumpram simultaneamente funções de professores, supervisores e analistas gerando tecidos de transferência difíceis de gerir. Nestes casos, um ar de exogamia parece mais do que benéfico. Por outro lado, os institutos de sociedades maiores, com muitas e muitos analistas altamente reconhecidos, estão melhor preparados para ampliar sua oferta. Mas também é preciso levar em consideração a situação das sociedades intermediárias, que se esforçam por manter a qualidade dos seus institutos e que poderiam sofrer com uma abertura e uma competição que, a longo prazo, coloca em dificuldades o que foi construído. O mais desejável será o respeito da autonomia de cada instituto para avaliar suas condições particulares, no espírito da posição que a América Latina vem propondo para o tema da teleanálise. 

Mas para além das considerações, digamos práticas, essa questão levanta preocupações subjacentes que gostaria de comentar. Há quem considere que pertencer a uma instituição é um elemento essencial na formação, na identidade e na coesão grupal do futuro analista. Para eles, a formação – e em especial a análise didática – implica também uma filiação, e que a transferência com a instituição e com a teoria circule através de um analista da mesma instituição. Caso contrário, haveria o risco de uma espécie de desintegração da formação.

Por outro lado, há quem proponha que é objetivo da análise didática liberar o analisando do impacto das transferências em jogo, que constituem antes um obstáculo, e um analista fora da instituição facilita essa desejada desidentificação e um nível de autonomia do analisando, graças à exogamia.

Como afirma Alberto Cabral (2024) “silenciar conflitos acarreta riscos maiores que colocá-los para trabalhar”. E colocá-los em prática exige pensar nessa tensão entre o estabelecido – que é o atual, o conhecido e aceito – com o que está por vir, que nos é apresentado sem pedir licença. E, como sugere Abel Fainstein (2024), são necessárias políticas institucionais para regular essas tensões a fim de evitar as armadilhas. Políticas que, diga-se, deveriam ser, por sua vez, susceptíveis de renovação contínua. Ou seja, capaz de transitar.

Mais do que nunca, justamente pelas mudanças dos tempos atuais, parece necessário refletir sobre quem somos nós que fazemos parte dessas instituições, como somos constituídos, e talvez questionar-nos sobre como evoluímos diante das mudanças da época. A partir da pesquisa realizada pela direção de Roberto Scerpella na FEPAL, em 2016, traçou-se uma espécie de perfil da atual psicanalista: é uma mulher de 64 anos, psicóloga. Podemos acrescentar, também, que é branca e de origem social média alta. Alguém mencionou em algum lugar que ela usava pashmina.

O Conselho Profissional da FEPAL considerou interessante investigar mais esses dados e gerar um diálogo sobre os mesmos, expandindo-os para muitos outros temas e mobilizando as opiniões sobre questões, umas mais críticas que outras, relacionadas com a profissão. Organizamos um Grupo de Diálogo no qual participaram 22 membros de diferentes instituições latino-americanas, no qual abordamos temas como diversidade, inclusão/exclusão, resistências institucionais, profissões de origem, elitismo econômico, racial e social, questões de gênero, de idade, entre outros.

Dessa rica troca de reuniões mensais durante sete meses, surgiu a necessidade de realizar uma pesquisa que, devo dizer, sofre de deficiências no método de coleta de dados, basicamente porque não contamos com um suporte técnico que gerenciasse o processo. Portanto, não vou entrar nos detalhes das respostas. Mas sim, gostaria de apresentar alguns dados que constituem informação valiosa sobre tendências que aparecem com clareza.

Por exemplo, em oito anos houve um aumento de 8% de mulheres, o que parece ser um valor alto em termos populacionais. Esta tendência, que evidentemente vem se acentuando, e que sabemos que ocorre em todas as profissões que se dedicam ao cuidado do corpo e da mente, levanta questões sobre se é necessário gerar iniciativas para compensar este desequilíbrio. Ou melhor ainda, investigar porque é que os homens deixam de se interessar por esse tipo de profissões em favor de disciplinas “científicas” e “numéricas” que, hoje, representam maior prestígio, status e melhores remunerações.

Portanto, sabemos que há uma demanda de analistas homens que não é atendida, principalmente no atendimento de crianças e adolescentes. É claro que este dado também merece ser pensado em termos de diferenças de gênero. Sabemos que a transferência transcende o gênero, mas também é certo que existem pacientes que solicitam um ou outro para iniciar una análise. Essas questões requerem ser discutidas e estudadas à luz das mudanças de época.

Outra questão que ocupou nossa atenção foi a da abertura à homossexualidade e, em geral, aos gêneros não normativos nas instituições. Parece que a homossexualidade entre os membros é bastante aceita. Dois dados da pesquisa reafirmam essa posição: o primeiro, que 14 das 18 instituições mostraram aceitação da homossexualidade dos seus membros, o que define uma posição institucional. O mesmo não acontece com a possibilidade de inclusão de colegas trans ou queer, o que ainda é digno de reflexão. A segunda informação é sobre a disponibilidade para debater o tema: 13 instituições responderam que sim, seja através de grupos de discussão ou estudo, seja através de seminários ou conferências; enquanto que 5 responderam que essa questão não foi levantada. Mesmo assim, essa resposta nos chamou a atenção se tratando de instituições psicanalíticas, que se espera que o tema esteja na mesa de discussão em todas elas.

Em termos da forma como somos racialmente constituídos, vemos que colegas negros ainda estão representados em pequenas porcentagens. Excetuam-se algumas instituições brasileiras, nas quais existem quatro projetos recentes de bolsas especificamente voltadas para esse grupo ou para povos indígenas, ou bolsas sociais de maneira geral. Estamos monitorando esses projetos com intenção de incentivar sua replicação em outras instituições da região. 

Outro dado marcante foi a alta porcentagem de mestiçagem declarado por instituições do México e Colômbia, e a ausência de valores estatísticos importantes de mestiçagem em outras, ainda quando pertencem a países que poderíamos claramente classificar de mestiços.

Isso fala do longo caminho que ainda temos que andar para deixar de lado a elitização que tanto prejudica nossa profissão, e poder imaginar políticas que incentivem a sua democratização. Não podemos falar de uma psicanálise inclusiva sem incorporar as questões de gênero, raça e classe em nossas instituições.

Questionando sobre as facilidades econômicas oferecidas aos analistas em formação, praticamente todas as instituições responderam afirmativamente. Na sua maioria, através de tarifas reduzidas para os análises e supervisões didáticas; em menor medida para os seminários e atividades científicas. Isso nos chamou a atenção porque destaca que a contribuição vem diretamente dos analistas que desejam (ou não) reduzir suas taxas para a formação, e não das instituições. Seria desejável promover políticas que permitissem um maior apoio institucional no esforço de democratização, através de tabelas de pagamento para seminários, por exemplo, que considerassem as possibilidades de cada analista em formação. Temos de compreender a democratização não apenas como uma facilidade para quem tem menos recursos, mas sim na perspectiva do enriquecimento que significa para as instituições contar com membros de diferentes estratos sociais, culturais, raciais e de gênero.

Também perguntamos sobre o nível de polarização política e social dentro das instituições. Para 13 instituições, há uma polarização intensa, média ou leve; enquanto 4 não tinham informação a respeito (uma manifestação clara de resistência) e 1 respondeu que não existe… e que deveria continuar assim. Apenas 6 responderam que debatem o tema. Mais uma vez, chama a atenção o escasso espaço para uma questão tão atual.

Em relação à idade dos analistas, a maioria situa-se no intervalo de 66 a 75 anos. A tendência aumenta em relação à pesquisa de 2016 que deu uma média de 64 anos. Este dado destaca o cuidado que os membros com idade mais avançada merecem e as políticas que podem ser implementadas em torno desse fato. Por exemplo, o projeto atualmente em curso sobre um fundo de pensões para psicanalistas e analistas em formação.  É de notar que, juntamente com o aumento da idade, surgem indicadores elevados entre os 46 e os 55 anos e, em alguns casos, entre os 36 e os 45 anos. Este facto deve-se à menor idade de entrada nos institutos.

A iniciativa de uma pesquisa foi muito produtiva em muitos sentidos. Para além de corrigir as deficiências desta primeira experiência, sugere-se que se desenvolva um mecanismo recorrente, talvez de dez em dez anos, para recolher informações sobre nós. Conhecer , por exemplo, quantos são professores ou escritores, quantos mantêm vínculos com as universidades ou hospitais, quantos trabalham na comunidade. Essa poderia ser uma ferramenta que facilitaria nos conhecermos mais e melhor, rever nossos pontos fortes e limitações e, principalmente, estabelecer políticas destinadas a fortalecer ou modificar, quando seja necessário, assuntos considerados importantes. Mas permitirá, sobretudo, levantar questões que precisam ser debatidas e gerar um diálogo permanente e fluido sobre os psicanalistas e sua profissão. 

Em uma palavra, transitar.

Referências bibliográficas:

Cabral, A. (2024). Respuesta a inquietudes de analistas en formación. Revista de Psicoanálisis de APA, LXXXI, 2024.

Fainstein, A. (2024). Institución psicoanalítica. Revista de Psicoanálisis de APA, LXXXI, 2024.

Fainstein, A. (2013). Institución Psicoanalítica. Especificidad, Obstáculos y Políticas. Una experiencia institucional. Tesis de Maestría en Psicoanálisis. Universidad del Salvador, Asociación Psicoanalítica Argentina, 2013.

Horenstein, M. (2024), El psicoanálisis del nuevo mundo. Permanencias. Transiciones. MutacionesRevista de Psicoanálisis de APA, LXXXI, 2024.

(Os textos publicados são de responsabilidade dos autores)

Categoria: Instituições psicanalíticas

Palavras-chave: instituições psicanalíticas, trânsito, formação, exogamia, renovação 

Imagem: A equipe do Conselho Profissional da FEPAL 2022-2024 que trabalhou nas questões levantadas no artigo. Maria Pia Costa, Luis Dávalos, Julia Velaochaga, Janine Severo, Paula López e Patricia Infante.

 Os ensaios do OP são postadosno Facebook. Clique no link abaixo para debater o assunto com os leitores da nossa página: 

 https://www.facebook.com/share/p/1A45Gy3Aca/?mibextid=wwXIfr

Nossa página no Instagram é @observatorio_psicanalitico

E para você, que é membro da FEBRAPSI e se interessa pela articulação da psicanálise com a cultura, inscreva-se no grupo de e-mails do OP para receber nossas publicações. Envie mensagem para op.febrapsi@gmail.com

_____________________________________________________________________________

Trabalho original em espanhol

Observatorio Psicoanalítico OP 567/2025

Ensayos sobre acontecimientos sociopolíticos, culturales e institucionales de Brasil y del Mundo

TIEMPOS DE TRÁNSITO

María Pía Costa – SPP (Sociedad Psicoanalítica del Perú)

Quisiera comenzar haciendo una suerte de alegato por las instituciones psicoanalíticas. Pocas son las profesiones que se apoyan tanto en sus instituciones como la nuestra, y eso tiene que ver con las particularidades de nuestro quehacer. Szpilka (citado por Fainstein, 2013) plantea que “la naturaleza peculiar de lo inconsciente necesita ampararse en instituciones que lo abriguen, y, a la inversa, paradójicamente, las estructuras institucionales necesitan, para subsistir: domesticar, apaciguar y aplacar al objeto cuya transmisión sostienen.”

Las instituciones psicoanalíticas constituyen el espacio que permite el despliegue de nuestra pasión por el psicoanálisis, en el que se entretejen múltiples relaciones transferenciales – pero también simplemente amicales-, un espacio en el que florece una historia que, para no terminar siendo atávica, debe sostener el interjuego entre tradición y renovación; y, fundamentalmente, un espacio que permite la generación de contenidos propios mediante la asimilación de un devenir compartido a lo largo de su crecimiento.

Sabemos que no siempre funciona así. Conocemos los problemas que causan el difícil manejo del poder, así como las transferencias y contratransferencias no resueltas entre analistas y analistas en formación. No son menos complejas las rivalidades entre colegas, en un ejercicio que expone los narcisismos a la vulnerabilidad de un trabajo que involucra a cada analista con sus propios movimientos internos, convirtiéndose en una amenaza para la convivencia y la libertad de pensamiento.

La institución psicoanalítica debe servir de coto a estas amenazas, intentando restringir los efectos contraproducentes que derivan no sólo de los riesgos -que son propios de toda institución-, sino de aquellos que nos son particulares por el carácter de la disciplina que nos convoca. La institución psicoanalítica tiene el reto de estar atenta a la tensión que existe entre la tradición y la renovación; entre lo endogámico y la apertura; entre lo estático y el movimiento. La institución psicoanalítica debe procesar la tensión de estas fuerzas en conflicto, para promover un equilibrio que permita la evolución y el dinamismo y, a la vez, garantice su permanencia.

Mariano Horenstein (2024), en su estupendo artículo El psicoanálisis del nuevo mundo, señala que más que retomar la teoría de los fundadores, la clave está en identificarnos con su perplejidad inicial. Descentrarnos del conocimiento como inmutable y macizo es imprescindible para aggiornar las instituciones psicoanalíticas en respuesta a los cambios de los tiempos actuales. Tiempos que, nos señala Mariano, ya no son sólidos, con límites precisos, ni líquidos a la manera de Bauman, ni aún gaseosos, que se evaporan, sino plasmáticos. Lo plasmático se refiere al cuarto estado de la materia, el más habitual en el universo, pues es el estado de las estrellas. También lo es el de las pantallas que tanto nos rodean. Es informe y se anima mediante cargas electromagnéticas. Dejemos que él mismo aterrice esta idea a nuestra práctica: “En las estrellas, todo es plasma excepto la materia oscura. Esa materia oscura podría ocupar el lugar de lo real frente al cual pivoteamos, la muerte, el límite, parteaguas con lo simbólico donde se acaban las palabras, el lugar de la angustia. Más tarde o más temprano, un análisis se topa con ese límite.”

Con esperanzadora energía, insiste en que el psicoanálisis sigue siendo la mejor teoría conocida sobre la mente, y el lugar del analista tendría que ser aquél de los intersticios, del movimiento, de lo que disloca, del resto, de lo forcluído, de la frontera. Nos propone, en suma, abarcar como tema epistémico lo trans. Retomando el enfoque de las instituciones como un espacio, lejos de ser una roca, debe acoger el tránsito, la transición, la transposición y la transformación.

Estas reflexiones atraviesan los desafíos actuales y las decisiones institucionales. Asumiendo ese reto, el Consejo Profesional de FEPAL consideró explorar la posibilidad, abierta a partir de la pandemia y de la tecnología mediática, de acceder a seminarios, supervisiones y análisis didácticos fuera de la institución de origen. Tema que comienza a aparecer en el panorama de los institutos.

El asunto es delicado, y tomará su tiempo en ir decantando. Es innegable el beneficio que supondría para las pequeñas sociedades, que cuentan con muy pocos analistas didactas, que cumplen simultáneamente funciones de profesores, supervisores y analistas, generando tejidos transferenciales de difícil manejo. En estos casos, un aire de exogamia parece más que beneficioso. Por otro lado, los institutos de sociedades más grandes, con muchas y muchos analistas altamente reconocidos, se encuentran mejor preparados para ampliar su oferta. Pero es necesario también tener en consideración la situación de sociedades intermedias, que se esfuerzan por mantener la calidad de sus institutos y que podrían sufrir con una apertura y una competencia que, a la larga, ponga en dificultades lo construido. 

Lo más deseable será el respeto de la autonomía de cada Instituto para evaluar sus condiciones particulares, en el espíritu de la postura que viene proponiendo América Latina para el tema del teleanálisis.  

Pero más allá de las consideraciones, digamos prácticas, este tema levanta preocupaciones de fondo que me gustaría comentar. Hay quienes consideran que la pertenencia a una institución es un elemento esencial en la formación, en la identidad y en la cohesión de grupo del futuro analista. Para ellos, la formación -y el análisis didáctico en particular- implica también una filiación, y la transferencia con la institución y con la teoría circula a través de un analista de la misma institución. De lo contrario, se correría el riesgo de una suerte de disgregación de la formación.

Por otro lado, hay quienes plantean que es objetivo del análisis didáctico liberar al analizando del impacto de las transferencias en juego que constituyen más bien un obstáculo, y un analista ajeno a la institución facilita esta deseada desidentificación y un nivel de autonomía del analizando, gracias a la exogamia.

Como señala Alberto Cabral (2024) en su artículo Respuesta a inquietudes de analistas en formación, “silenciar conflictos entraña mayores riesgos que ponerlos a trabajar”. Y ponerlos a trabajar requiere pensar en esa tensión entre lo instituido -que es lo actual, lo conocido y aceptado- con lo por venir, que se nos presenta sin pedir permiso. Y como plantea Abel Fainstein (2024), se requieren políticas institucionales que regulen estas tensiones para evitar los entrampamientos. Políticas que, habría que decirlo, tendrían que ser, a su vez, susceptibles de renovación continua. Es decir, susceptibles de transitar.

Más que nunca, justamente por lo cambiante de los tiempos actuales, parece necesaria una reflexión sobre quiénes somos los que formamos parte de estas instituciones, cómo estamos conformados, y preguntarnos sobre cómo evolucionamos frente a los cambios de la época. A partir de una encuesta llevada a cabo por la gestión de Roberto Scerpella en FEPAL en 2016, se dibujó una suerte de perfil del psicoanalista actual: se trata de una mujer, de 64 años, psicóloga. Podemos agregar, además, que es blanca y de extracción social media alta. Alguien mencionó por ahí, que usaba pashmina.

El Consejo Profesional de FEPAL -del que fui Directora entre 2022 y 2024- consideró interesante indagar más en estos datos y generar un diálogo sobre ellos, ampliándolo a muchos otros temas y movilizar las opiniones sobre asuntos, algunos más álgidos que otros, relativos a la profesión. Organizamos un Grupo de Diálogo en el que participaron 22 miembros de diferentes instituciones latinoamericanas, en los que abordamos temas como diversidad, inclusión/exclusión, resistencias institucionales, profesiones de origen, elitismo económico, racial y social, temas de género, de edad, entre muchos otros.

De ese riquísimo intercambio en reuniones mensuales durante siete meses, surgió la necesidad de realizar una encuesta que, debo decir, adolece de deficiencias en el método de acopio de los datos, básicamente porque no contamos con un soporte técnico que manejara el proceso. Por ello, no voy a extenderme en los detalles de las respuestas. Pero sí quisiera presentarles algunos datos que constituyen información valiosa sobre tendencias que aparecen con claridad.

Por ejemplo, en ocho años ha habido un aumento del 8% de mujeres, lo cual parece ser una cifra alta en términos poblacionales. Esta tendencia que viene acentuándose a ojos vista, y que sabemos se da en todas las profesiones destinadas al cuidado del cuerpo y de la mente, nos plantea preguntas sobre si es necesario generar iniciativas para compensar este desbalance. O mejor aún, indagar por qué los hombres desisten de interesarse por este tipo de profesiones en favor de disciplinas “científicas” y “numéricas” que, hoy por hoy, representan mayor prestigio, estatus y mejores remuneraciones.

Sin embargo, sabemos que existe una demanda de analistas hombres que no se llega a cubrir, sobre todo en la atención de niños y adolescentes. Por supuesto, este dato también merece la pena de ser pensado en términos de las diferencias de género. Sabemos que la transferencia trasciende el género, pero es cierto también que hay pacientes que solicitan uno u otro para iniciar un análisis. Estas preguntas requieren ser puestas en discusión y en estudio a la luz de los cambios de época.

Otro tema que ocupó nuestra atención fue el de la apertura hacia la homosexualidad y, en general, hacia los géneros no normativos en las instituciones. Parece ser que la homosexualidad entre los miembros está bastante aceptada. Dos datos de la encuesta reafirman esta postura: el primero, que 14 de 18 instituciones mostraron aceptación a la homosexualidad de sus miembros, lo que define una postura institucional. No sucede así con la posibilidad de incluir a colegas trans o queer, lo que merece sin duda aún reflexión. El segundo dato es sobre la disposición a debatir el asunto: 13 instituciones respondieron que sí lo hacían, ya sea mediante grupos de discusión o estudio, o a través de seminarios o conferencias; mientras que cinco respondieron que no se planteaba el tema. Aun así, nos llamó la atención esta respuesta tratándose de instituciones psicoanalíticas, siendo esperable que el tema esté en la mesa de discusión en todas ellas.

En cuanto a cómo estamos constituidos en lo racial, vemos que colegas negros están aún representados en porcentajes reducidos. Son excepción algunas instituciones brasileñas, en las que existen cuatro proyectos recientes de becas específicamente dirigidas a este grupo y a indígenas, o becas sociales de manera general. Será necesario hacer un seguimiento de estos proyectos con miras a fomentar que se repliquen en otras instituciones de la región. 

Otro dato llamativo fue el alto porcentaje de mestizaje declarado por instituciones de México y Colombia, y la ausencia de valores estadísticos importantes de mestizaje en otras, aun cuando pertenecen a países que podríamos calificar claramente de mestizos.

Esto habla del largo camino que tenemos por andar aún con miras a dejar de lado la elitización que tanto daña nuestra profesión, y poder imaginar políticas que incentiven su democratización. No podemos hablar de un psicoanálisis inclusivo, sin incorporar los temas de género, raza y clase en nuestras instituciones.

Indagando sobre las facilidades económicas ofrecidas a los analistas en formación, prácticamente todas las instituciones respondieron afirmativamente. En su mayoría, mediante tarifas reducidas para los análisis didácticos y las supervisiones; en menor proporción para los seminarios y actividades científicas. Esto nos llamó la atención porque resalta que el aporte proviene directamente de los analistas con disposición (o no) a reducir sus tarifas para la formación, y no de las instituciones. Sería deseable impulsar políticas que permitan un mayor apoyo institucional en el esfuerzo democratizador, mediante escalas de pago de los seminarios, por ejemplo, que consideren las posibilidades de cada analista en formación. Debemos entender la democratización no sólo como una facilidad para quienes tienen menos recursos, sino desde la perspectiva del enriquecimiento que significa para las instituciones contar con miembros de diferentes estratos sociales, culturales, raciales y de género.

Preguntamos también sobre el nivel de polarización política y social dentro de las instituciones. Para 13 instituciones existe una polarización intensa, mediana o leve; mientras que 4 no tenían información al respecto (una clara manifestación de resistencia) y 1 respondió que es inexistente… y que debería seguir siéndolo. Sólo 6 respondieron que debaten sobre el tema. De nuevo, llama la atención el escaso espacio para un tema tan actual.

En cuanto a la edad de los analistas, la mayoría se encuentra en el rango de 66 a 75 años. La tendencia aumenta en relación con la encuesta de 2016 que daba en promedio 64 años. Este dato pone en relevancia el cuidado que merecen los miembros de edad avanzada y las políticas que pueden implementarse en torno a este hecho. Es de resaltar que, junto con el aumento de edad, aparecen altos indicadores entre los 46 y los 55 años, y en algunos casos entre los 36 y los 45 años. Esto debido a la disminución de la edad de ingreso a los institutos.

La iniciativa de una encuesta ha sido muy productiva en muchos sentidos. Además de corregir las deficiencias de esta primera experiencia, sugerimos elaborar un mecanismo recurrente, tal vez cada diez años, para el levantamiento de información sobre nosotros. Conocer, por ejemplo, cuántos son profesores o escritores, cuántos mantienen vínculos con las universidades u hospitales, cuántos trabajan en la comunidad. Esta podría ser una herramienta que facilitaría conocernos más y mejor, revisar nuestras fortalezas y limitaciones y, fundamentalmente, establecer políticas destinadas a vigorizar o modificar, cuando sea necesario, asuntos que se consideren de importancia. Pero podrá permitir, por encima de todo, levantar temas que requieren ser debatidos y generar un diálogo permanente y fluido sobre los psicoanalistas y su profesión. 

En una palabra, transitar.

Referencias bibliográficas

Cabral, A. (2024). Respuesta a inquietudes de analistas en formación. Revista de Psicoanálisis de APA, LXXXI, 2024.

Fainstein, A. (2024). Institución psicoanalítica. Revista de Psicoanálisis de APA, LXXXI, 2024.

Fainstein, A. (2013). Institución Psicoanalítica. Especificidad, Obstáculos y Políticas. Una experiencia institucional. Tesis de Maestría en Psicoanálisis. APA, 2013.

Horenstein, M. (2024), El psicoanálisis del nuevo mundo. Permanencias. Transiciones. MutacionesRevista de Psicoanálisis de APA, LXXXI, 2024.

(Los textos publicados son responsabilidad de los autores)

Categoría: Instituciones psicoanalíticas

Palabras claves: instituciones psicoanalíticas, tránsito, formación, exogamia, renovación 

Imagen: El equipo del Consejo Profesional de FEPAL 2022-2024 que trabajó los temas planteados en el artículo. Maria Pia Costa, Luis Dávalos, Julia Velaochaga, Janine Severo, Paula López y Patricia Infante.

Los ensayos del OP se publican en Facebook. Haz clic en el enlace a continuación para debatir el tema con los lectores de nuestra página: 

https://www.facebook.com/share/p/1A45Gy3Aca/?mibextid=wwXIfr

Nuestra página en Instagram es @observatorio_psicanalitico

Y para ti, que eres miembro de la FEBRAPSI y te interesa la articulación del psicoanálisis con la cultura, inscríbete en el grupo de correos del OP para recibir nuestras publicaciones. Envía un mensaje a op.febrapsi@gmail.com

Tags: exogamia | formação | Instituições Psicanalíticas | renovação | trânsito
Share This