Observatório Psicanalítico OP 560/2025 

Ensaios sobre acontecimentos sociopolíticos, culturais e institucionais do Brasil e do Mundo

A filha de Adelheid Lucy Koch

Eliane de Andrade – SPRJ

Está nos cinemas brasileiro o documentário “As cores e Amores de Lore”, do genial Jorge Bodanzky. Nós, mais velhos, nos lembraremos de seu “Iracema, uma transa amazônica” de 1974, marco do cinema documental brasileleiro, muito premiado!

Com a doçura que lhe é peculiar, Bodanzky vai nos apresentando Lore, que se chamava Eleonore Koch, filha da pioneira da psicanálise no Brasil, Adelheid Koch, da equipe de Durval Marcondes. Sua importância na criação da psicanálise brasileira é enorme, embora a película só aluda a ela, já que está centrada na história da filha Eleonore. 

O diretor nos mostra a travessia/fuga da Alemanha nazista para o Brasil em 1936, a chegada em Santos, o estabelecimento da vida em terras brasileiras. Não diz, mas nos remete à adaptação que esta mudança traz, à dor do exílio, às novidades que as jovens filhas do casal Koch encontram. Podemos imaginar a moça crescendo em São Paulo e se desenvolvendo, buscando seus sonhos, se tornando uma mulher, como ela mesma define , “livre”.

É com emoção que vamos vendo uma senhora idosa nos contar sua vida de artista plástica, da luta para ser uma no Brasil, já nos seus últimos momentos de vida. 

O sotaque alemão e o alto desejo de ser uma mulher livre no pós-guerra em terras tupiniquins, muito feminino e delicado, com a sensível narrativa das escolhas que teve que fazer para seguir realizando-se na sua pintura, nos emociona e comove, pois se trata de uma anciã que olha para trás vendo-se e aprovando-se, apesar dos altos preços que pagou por tudo que escolheu.

Fica claro para o espectador a busca de uma sexualidade fortemente marcada pelo desejo de ser livre, sem freios (pelo quê ela inclusive esteve presa), pelo não desejo (mas com reticências no discurso do final da vida) de casar, uma interpretação que cada espectador poderá dar, de acordo com sua leitura da sexualidade feminina daquela época, das brasileiras, e da época atual. Forte! Mas apresentada de maneira muito delicada, reflexiva. Como sói a quem muito se analisou.

A convivência com Volpi e suas discordâncias (foi sua única discípula!), sua crítica ferina ao universo da sobrevivência financeira em se desejando viver de arte, narrado por uma Eleonore muito idosa e lúcida, fazem do filme/documentário uma obra de sensibilidade tocante e afinada! 

A presença da psicanálise na vida da filha de Adelheid, seu respeito ao nosso trabalho, sua busca por uma análise sem contaminações, tornaram o filme interessantíssimo para mim! Mas convenho que foi só para mim, pois terminei de vê-lo numa sala onde eu era a única espectadora! Considerações psicanalíticas podem ser feitas aqui…

Deliciosa é a passagem em que ficamos sabendo quem era a entregadora dos livros que Freud comprava em Viena. Vejam o filme para descobrir!

Jorge Bodanzky nos presenteia como homem sensível, de olhar feminista, empático e militante contra o olvido a que a arte tende a se manter durante o tempo de vida de quem a desenvolve. E ao final, nos mostra a cruel sina de grande parte dos artistas, mesmo quando encontram pessoas tão especiais como Lore encontrou Jorge.

Lore, que pena não a ter conhecido em vida! 

Que grandes contribuições estes imigrantes nos trouxeram. Viva Eleonore Koch e Jorge Bodanzky!

(Os textos publicados são de responsabilidade dos autores)

Categoria: Cultura

Palavras-chave: cinema, psicanálise, Eleonore Koch, artes plásticas, imigrantes.

Imagem: Foto de Eleonore Koch em 1959. Fonte: Jornal da USP

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Categoria: Cultura
Tags: artes plásticas | Cinema | Eleonore Koch | imigrantes | Psicanálise
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