Ensaios sobre acontecimentos sociopolíticos, culturais e institucionais do Brasil e do Mundo
A presença de Carlos Gari Faria
Anette Blaya Luz (SPPA)
Conheci Carlos Gari Faria no início dos anos de 1960, quando ele era residente de Psiquiatria. Com seu falecimento, nesse 23 de novembro, aos 84 anos, a psicanálise brasileira perdeu um de seus mais destacados e ativos membros. Seus pacientes, supervisionandos e alunos perdem um analista, supervisor e professor talentoso e profundo; a SPPA e a FEBRAPSI um leal e devotado participante e líder, eu um amigo e sua família um esposo, pai e avô amoroso e dedicado.
Gari, como era conhecido e chamado por todos que tiveram o privilégio de conviver com ele, nasceu em São Sepé, no Rio Grande do Sul, concluiu seu curso de Medicina na Universidade Federal de Santa Maria em 1962 e seu Curso de Especialização em Psiquiatria na Clínica Pinel, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul em 1965. Realizou sua formação analítica na SPPA entre 1976 e 1979, tornando-se Membro Associado em 1987, com o trabalho “Problemas de separação-individuação em uma paciente com caráter fóbico-obsessivo”, e Membro Efetivo em 1994, com o trabalho “Caráter: considerações”.
Desde esse ano, passou a Analista Didata, e progressivamente se tornou um dos colegas mais procurados e apreciados por analistas em formação para análise e supervisão. Era claramente perceptível, para colegas, alunos e pacientes, que Gari possuía uma sólida cultura psicanalítica, embasada principalmente na obra de Freud e mais tarde também na de Green, dos quais era um profundo conhecedor. Salientava-se também por sua acuidade clínica, que lhe permitia uma escuta analítica empática e uma fácil captação do inconsciente, além de uma forma de conviver com as pessoas natural, afetuosa e genuinamente interessada em ouvir, conhecer e se relacionar.
Do ponto de vista institucional, Gari exerceu a presidência da SPPA de 1998 a 1999, a Direção do Instituto de 2016 a 2017 e foi Diretor Científico em duas gestões, levando para essas atividades as características descritas acima, contribuindo para o desenvolvimento da formação e da vida associativa com espírito democrático e integrador.
Depois de exercer vários cargos em sucessivas diretorias da FEBRAPSI (então ABP), Gari foi eleito Presidente para a gestão 2003-2005, tendo também presidido o XX Congresso Brasileiro de Psicanálise, realizado em Brasília, com o tema que continua atual, “Poder, Sofrimento Psíquico e Contemporaneidade”, tendo em sua abertura as conferências dos então Ministro da Educação, Cristovão Buarque, e do Presidente da IPA, Cláudio L. Eizirik.
Atento à importância de desenvolver o relacionamento e ampliar o convívio com os psicanalistas de língua portuguesa da África e de Portugal, Gari foi o organizador brasileiro, em nome da FEBRAPSI, do Primeiro Congresso Luso-Brasileiro, realizado em Lisboa em 2005, com o tema “Navegar é preciso, viver não é preciso”.
Depois de seu mandato, Gari continuou extremamente ativo no cenário psicanalítico brasileiro e internacional, participando de todos os congressos da Febrapsi, dos da FEPAL e da IPA e sendo muito convidado para encontros de sociedades e grupos de estudos, para conferências e supervisões.
Ao longo de sua vida, Gari dedicou-se com generosidade ao ensino da psicanálise, de seus conceitos e aplicações clínicas, tendo sido um muito reconhecido professor do Curso de Psicologia da PUC-RS, onde foi homenageado por inúmeras turmas, e também professor e supervisor do Curso de Especialização em Psicoterapia de Orientação Analítica do Centro de Estudos Luiz Guedes do departamento de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Sendo um incansável viajante, sempre em companhia de sua esposa Izabel, Gari nunca deixou de se encantar com novas pessoas e novos lugares, e deixará saudades entre os muitos amigos e amigas que fez e manteve tanto no mundo psicanalítico brasileiro e latino-americano, como fora dele.
A presença de Carlos Gari Faria, em todos esses âmbitos, foi sempre forte, decidida, afetuosa, gentil, solidária, norteada por sua sólida identidade psicanalítica e por sua ampla cultura humanística. Deixa a todos nós um belo exemplo e uma grande saudade.
Amigo querido e leal, colega competente, homem elegante e delicado com todos, já nos deixa saudosos de seu convívio afetuoso e agradável.
(Os textos publicados são de responsabilidade de seus autores)
Categoria: Homenagens
Palavras-chave: Carlos Gari Faria, Psicanálise brasileira, História da psicanálise
Colega, click no link abaixo para debater o assunto com os leitores da nossa página no Facebook: