Observatório Psicanalítico 29/2017
Ensaios sobre acontecimentos sociais, culturais e políticos do Brasil e do mundo.
Morte e vida: novas configuraçōes
Ney Marinho
Nosso Congresso nasceu sob a palavra do poeta – morte e vida, novas configurações, cheio de dúvidas e esperanças, como talvez os humanos nasçam, mas não nos lembremos!
Neste dois anos, desde a escolha do tema até esta abertura, percorremos com os companheiros de diretoria este país de Pelotas a Fortaleza, do Rio de Janeiro a Brasília. Fomos também a Lisboa encontrar nossos irmãos de língua portuguesa, ouvir e discutir como se vive e se morre em nossos tempos e em nossas culturas.
Nestes dois anos também assistimos a volta dos fantasmas da intolerância, do conservadorismo obscurantista, do racismo, dos muros e embargos, da xenofobia que, se por um lado, nos despertou mais tédio e cansaço do que medo, como outrora, por outro, deu mais sentido à nossa proposta de realizar um congresso pluralista e inclusivo.
Se o nosso país é mestiço e disto estamos aprendendo a orgulhar-nos, culturalmente é aberto às diferentes influências e temos, no nosso caso, desenvolvido uma psicanálise altamente diferenciada, onde se pode aprender de Freud a Lacan, passando por Klein, Winnicott, Bion e Kohut, sem falar em Ferenczi e Green, entre outros, sem apelar a fontes externas. Adquirimos uma legítima autossuficiência nesse campo que se expressa nos grupos de trabalho e cursos de nosso programa. Da mesma forma incluímos em nossa grade diversas áreas de interlocução da psicanálise, daí as inúmeras mesas de psicanálise e universidade, educação, artes plásticas, literatura, cinema, política, religião, filosofia e pesquisas que aqui prosperam de forma singular: como os estados primitivos da mente, o atendimento a crianças, pais – bebês, idosos e espectro autista.
Neste trajeto encontramos novos parceiros, como a UNILAB – nossa Universidade da Lusofonia – e o SESC CE, braço social da Fecomércio, com os quais a sintonia foi imediata. Sentimo-nos tal como Dante, guiado por Virgílio, conduzidos por João Cabral, para empreender com este povo nordestino, sofrido e valente, o caminho de novas descobertas. Inesquecível ver a experiência de uma universidade de negros – de todas as etnias da Velha África – como em Redenção, ou em São Francisco do Conde, visitar o Campus dos Malês, no município mais negro do Brasil. Isto nos permitiu vir até aqui com o mesmo entusiasmo com que, na juventude, muitos de nós pensávamos transformar o Brasil num país de todos e não de alguns.
Este Congresso é apenas mais um passo, fruto de 50 anos de Febrapsi, do esforço de muitas gestões anteriores, no sentido de trazer a psicanálise para as nossas culturas como um instrumento de libertação para o pensar livre e responsável.
Neste trajeto nosso principal obstáculo reside em nós mesmos. Na resistência ao novo, ao desconhecido.
Desejamos, voltando ao nosso poeta, que tomem este programa como um caderno novo, com a alegria do novo, para nele escreverem uma nova história das relações da psicanálise com a cultura brasileira.
(Os textos publicados são de responsabilidade de seus autores).