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Leia artigo do diretor científico da FEBRAPSI, Ignácio Paim Filho: O Duplo: permanência e transitoriedade

28 / novembro / 2018

XXVII Congresso Brasileiro de Psicanálise – 2019

O Estranho – Inconfidências

O Duplo: permanência e transitoriedade

A verdade, porém, é que o escritor verdadeiramente criativo jamais obedece a essa injunção. A descrição da mente humana é, na verdade, seu campo mais legitimo; desde tempos imemoriais ele tem sido um precursor da ciência e, portanto, também da psicologia científica (Freud, 1907).

São Paulo, 30 de novembro e 01 de dezembro de 2018. Nestas datas a FEBRAPSI e a Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo promoverão uma atividade conjunta, com o objetivo de trabalhar a temática do próximo congresso brasileiro, que ocorrerá em Belo Horizonte, de 19 a 22 de junho de 2019.

Nessa oportunidade abordaremos, com especial atenção, o intrigante fenômeno do Duplo (alma imortal?) exercitando um diálogo interrogativo entre a metapsicologia, a clínica e a literatura. Por esse intercurso pretendemos abordar o estranho processo pelo qual ocorre a constituição do Eu, no seu trânsito entre Narciso e Édipo, com seus mandatos endogâmicos e exogâmicos.

Freud (1919), com um objetivo semelhante, faz uma interlocução com Hoffmann, através do Homem de Areia, que legitima sua sinistra afirmação de 1907, em relação aos escritores criativos: precursor da ciência, ou ainda, da psicologia cientifica. Prenúncio da sua célebre confidência, com certa dose de inconfidência, de 1922, em relação a Schnitzler: Acho que evitei o senhor por causa de uma espécie de relutância em conhecer o meu duplo. Modo próprio de usar si como objeto de estudo, visando ratificar a sua busca, para fazer do estranho, exemplificado no duplo, um conceito específico. Nesse sentido segue: […] suas reflexões sobre a polaridade do amor e a morte, tudo isso me comoveu com inquietante familiaridade (Freud, 1922).

Através de uma fértil interação com o mestre da literatura fantástica, Freud, tal qual Schnitzler, vai explorar as profundezas psicológicas, que estão implicadas nas vicissitudes pulsionais de Natanael: do representável ao irrepresentável. O estranho se apresentando em suas diferentes roupagens, desacomodando a lógica do processo secundário, permitindo que venha à luz o secreto, de forma clandestina, com seus inebriantes mistérios. Nosso enigmático protagonista desliza em meio a figuras – Pai/Coppelius; Olímpia/Clara; Coppola/Spalanzani – com as quais estabelece uma relação de complementariedade, que dão voz ao conhecido/desconhecido em si: revelando o duplo, em seu aspecto protetor, garantia de viabilizar uma existência para Eu, e o tanático, quando da sua persistência não metabolizada (sombra do objeto?). Por esses caminhos a temática da cisão, o mais além do recalque, se presentifica. A renegação começa a desenhar o seu lugar na estruturação anímica: enérgico desmentido do poder da morte (Rank, 1914). Diante dessas considerações poderíamos compreender o duplo como tendo seu destino determinado pela pulsão de apoderamento das figuras parentais? Império do ser em detrimento do ter? Permanência e transitoriedade tecendo o entrelaçamento entre Eros e destrutividade?

Na narrativa do Das Unheimliche (1919) o escritor/analista Freud, do mesmo modo como os escritores criativos, vai convidando o leitor a deixar-se levar por essa experiência estética: a importância de viver em si essa peculiar sensação. A qualidade do sentir no intercãmbio entre o repulsivo e o doloroso vai gerando estranhamentos e anunciando a problemática da eterna repetição do mesmo. A castração, marca do corte, vai sendo teatralizada, entre ser reconhecida e não conhecida, na vida fantasmática dos personagens do conto de Amadeus Hoffmann, gerando dúvidas quanto à veracidade dos fatos: fantasia ou realidade?  

Esses são alguns apontamentos que deixo registrados, na expectativa de que sejam propulsores do desejo de revisitar o pensamento freudiano. Tendo como sinalizador a inquietante recomendação: Olhar as mesmas coisas repetidas vezes até que elas comecem a falar por si mesmas (Charcot, citado por Freud, 1914).

Abraços, até breve.

Aguardamos vocês.

Ignácio Paim Filho

Diretor científico da Febrapsi

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